Acesso a Bens Digitais no Inventário - Passo a Passo
O Passo a Passo para obter acesso judicial a bens digitais no inventário geralmente envolve o inventariante informar o juízo sobre a existência dos ativos digitais conhecidos já na petição inicial ou em petição incidental nos autos. É fundamental instruir o pedido com documentação que comprove a titularidade do falecido sobre esses bens (como extratos, e-mails de registro, prints) e apresentar uma justificativa clara e fundamentada para a necessidade do acesso, demonstrando o valor econômico dos bens patrimoniais para inclusão no espólio ou uma “justa causa” relevante para o acesso a conteúdos pessoais, idealmente comprovando tentativas administrativas prévias com as plataformas. O juiz, avaliando a solicitação e a documentação, pode lançar mão de instrumentos judiciais como alvarás específicos para bens líquidos ou ações/incidentes de exibição de documentos/dados para compelir as plataformas a fornecerem as informações ou acesso necessário, sempre ponderando o direito à herança e a proteção à privacidade do falecido e de terceiros.
Em contraste com a via judicial, a inclusão de bens digitais no inventário extrajudicial, realizado em Cartório de Notas, apresenta-se como uma alternativa mais célere e, em tese, simplificada, condicionada, em regra, à existência de consenso entre todos os herdeiros, e à ausência de testamento (salvo exceções específicas). Contudo, a principal limitação fundamental do Tabelião de Notas reside na ausência de poder coercitivo, o que significa que ele não possui mecanismos legais para compelir plataformas digitais a fornecerem informações, dados de acesso ou realizarem a transferência de titularidade de ativos. Dessa forma, a efetiva inclusão de bens digitais por esta via depende crucialmente da colaboração voluntária das empresas detentoras dos serviços e da capacidade dos herdeiros de apresentarem documentação robusta e completa que comprove a existência e a titularidade dos bens digitais. Isso tende a restringir a inclusão extrajudicial a ativos com prova clara de titularidade e valor, como criptomoedas em exchanges nacionais colaborativas, domínios de internet ou contas com saldo facilmente comprovável, tornando a via judicial, por vezes, indispensável para bens digitais protegidos por termos de serviço restritivos ou mantidos por plataformas não colaborativas. Embora o Projeto de Lei 4/2025, em tramitação, preveja que a escritura pública de inventário possa servir como título hábil para transferência junto às plataformas, a ausência de padronização e a resistência de empresas, especialmente as estrangeiras, ainda constituem desafios significativos na prática.
Nesse artigo…
- O Fundamento Jurídico e os Critérios de Acesso
- O Procedimento Judicial e a Documentação Essencial
- O Papel do Inventariante: Um Verdadeiro Detetive Digital
- Avaliando Ativos Digitais Específicos: Um Olhar Técnico
- Passo a Passo: Acesso Judicial a Bens Digitais no Inventário
- Inventário Extrajudicial de Bens Digitais
- A História de Maria e a Herança Digital de João
- Casos e Estudos Práticos na Herança Digital
- Cenário 1: As Memórias Digitais de um Jovem – O “Caso Apple ID”
- Cenário 2: O E-mail Essencial para o Inventário
- Cenário 3: O Celular Bloqueado
- Cenário 4: Criptomoedas, Canais Monetizados e Domínios
- FAQ: Perguntas Frequentes
- Conclusão

Procedimento para Acesso e Avaliação de Bens Digitais: Guia Completo
A vida moderna está cada vez mais conectada. Nossas memórias, relacionamentos e até mesmo parte do nosso patrimônio existem hoje no ambiente digital. Mas o que acontece com tudo isso quando alguém falece? A “herança digital” representa um dos desafios mais complexos e contemporâneos do direito sucessório brasileiro. Navegar por esse universo de contas, dados e ativos virtuais após a perda de um ente querido pode ser confuso, especialmente pela ausência de uma lei específica abrangente sobre o tema no Brasil.
Por isso, este post busca jogar luz sobre como o Judiciário e a legislação em construção (como o PL 4/2025) vêm tratando a herança digital, focando no papel crucial do inventariante e nos passos práticos para acessar e avaliar esses bens.
O Fundamento Jurídico e os Critérios de Acesso: Patrimônio vs. Existência
Como não temos uma lei específica, juízes e tribunais recorrem a normas gerais do direito das sucessões, da personalidade, do Código Civil (CC), da Constituição Federal (CF) e do Marco Civil da Internet. O princípio da saisine (transmissão imediata da herança aos herdeiros com a morte) é fundamental para argumentar a inclusão de ativos digitais no espólio.
Aqui, surge uma distinção crucial que guia as decisões judiciais:
- Bens Digitais Patrimoniais: Pense em criptomoedas, contas monetizadas (como canais no YouTube ou Twitch), domínios de internet de valor, milhas aéreas acumuladas ou saldos em contas de pagamento digital. Esses ativos têm valor econômico mensurável e, geralmente, são tratados como bens intangíveis que integram o patrimônio do falecido. A tendência judicial é autorizar o acesso a eles para que possam ser inventariados e partilhados.
- Bens Digitais Existenciais/Pessoais: São fotos privadas, e-mails pessoais, mensagens em nuvem, redes sociais não monetizadas. Esses conteúdos estão mais vinculados aos direitos da personalidade (como intimidade, privacidade e imagem). Por isso, em regra, são considerados intransmissíveis. O acesso a eles é bem mais restrito, exigindo cautela redobrada.
Os tribunais adotam critérios rigorosos para autorizar o acesso judicial, especialmente a conteúdos privados:
- Relevância Econômica ou Interesse Patrimonial Claro: É o critério mais forte para bens patrimoniais. Precisa-se demonstrar que o ativo tem “vulto econômico” ou é “necessário à administração do espólio”.
- Justa Causa: Para bens existenciais, o acesso só se justifica por uma “justa causa”, que pode ser um “interesse legítimo qualificado”. Isso inclui, por exemplo, a necessidade de encontrar documentos importantes para o inventário (como uma apólice de seguro em um e-mail) ou, em alguns casos, a preservação da memória familiar (como fotos ou vídeos de valor afetivo).
- Ausência de Manifestação Expressa do Falecido em Contrário: Se a pessoa não deixou testamento, codicilo digital ou qualquer instrução proibindo o acesso, os tribunais podem ser um pouco mais flexíveis. No entanto, a ausência dessa proibição não abre um “cheque em branco”; a natureza do conteúdo e a privacidade de terceiros continuam sendo rigorosamente avaliadas.
- Necessidade para a Administração do Espólio: O acesso é justificado se for indispensável para o inventariante cumprir suas funções, como identificar bens, pagar dívidas ou partilhar o patrimônio.
É importante notar que a jurisprudência ainda não é totalmente uniforme. Tribunais como o TJMG mostram maior restrição, com forte ênfase na proteção da privacidade do falecido. Já o TJSP, em alguns casos específicos, demonstrou maior flexibilidade, ponderando o valor afetivo e a ausência de disposição contrária. Essa variação mostra que cada caso é analisado de forma única (“casuística”), dependendo da argumentação e das provas apresentadas.
O Procedimento Judicial e a Documentação Essencial
Diante da resistência das plataformas ou da falta de credenciais de acesso, a intervenção judicial se torna primordial, e muitas vezes única, para o inventariante.
Como pedir o acesso na Justiça?
Geralmente, você tem duas opções:
- Pedido Incidental no Próprio Inventário: É a via mais comum e, em tese, mais rápida. Você faz uma petição dentro do processo de inventário que já está correndo, solicitando um alvará ou autorização judicial para acessar bens digitais específicos. Essa opção funciona bem quando os bens têm clara relevância patrimonial e você não espera uma briga grande com a plataforma.
- Ação Autônoma: Se o caso for muito complexo, envolver perícias técnicas difíceis, ou se a plataforma digital já indicou que não vai colaborar sem uma ordem judicial robusta, você pode precisar entrar com uma ação separada (como uma ação de exibição de documentos ou obrigação de fazer) contra a empresa detentora dos dados. Essa via permite discutir a questão com mais profundidade.
Que documentos você precisa apresentar?
Uma petição judicial bem instruída aumenta significativamente suas chances de sucesso. Prepare-se para juntar:
- Documentos básicos do inventário: Certidão de óbito, seu termo de inventariante (ou decisão que te nomeou), e documentos dos herdeiros e do falecido.
- Provas da existência e titularidade dos bens digitais: Isso pode ser um print de tela da conta, um e-mail de registro ou confirmação de compra, extratos de contas digitais/exchanges.
- Comprovante de que você tentou resolver administrativamente com a plataforma (e ela recusou). Guarde e-mails ou números de protocolo.
- A justificativa detalhada para o acesso: Explique claramente por que você precisa acessar esses bens. Para bens patrimoniais, mostre o valor econômico. Para bens existenciais, convença o juiz da “justa causa” (valor afetivo único, informação essencial para o inventário etc.).
- Se souber, uma cópia dos Termos de Serviço da Plataforma para mostrar as barreiras que ela impõe.
- Uma declaração (ou prova, se houver) sobre a ausência de testamento digital ou outras diretivas deixadas pelo falecido.
Em casos de urgência, como risco de perda de um ativo digital de valor volátil (tipo criptomoedas) ou de exclusão da conta, você pode pedir uma tutela de urgência (liminar) para garantir o acesso rápido.
O Papel do Inventariante: Um Verdadeiro Detetive Digital
O trabalho de inventariante já é complicado, mas na era digital, ele ganha novas camadas de complexidade. Suas responsabilidades se expandem para incluir:
- Identificar e Arrolar os Bens Digitais: Você precisa investigar a fundo para encontrar todos os ativos virtuais do falecido. O que pode ser um desafio e tanto!
- Buscar o Acesso Legal: Se o acesso direto for bloqueado (senhas desconhecidas, políticas da empresa), é sua função ir atrás dos meios judiciais para obtê-lo.
- Avaliar os Bens: Ativos com valor econômico precisam ser avaliados para a partilha e o cálculo de impostos.
- Prestar Contas: Você deve informar o juiz e os herdeiros sobre os bens digitais encontrados e as ações que tomou.
- Guardar Sigilo e Confidencialidade: Principalmente para dados pessoais acessados, você deve ser extremamente cauteloso.
Um grande desafio é navegar pela Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD). Embora a LGPD trate de dados de pessoas naturais (vivas), os direitos da personalidade póstuma (privacidade, intimidade) persistem para proteger o legado do falecido. O acesso a dados sensíveis do falecido ou, inevitavelmente, a dados de terceiros que interagiram com ele exige máxima cautela. O juiz pode, inclusive, impor restrições ao acesso, como limitar a busca, determinar que um perito filtre as informações ou proibir a divulgação de conteúdo não patrimonial.
Além disso, o inventariante pode enfrentar resistência das plataformas digitais. Muitas empresas, especialmente multinacionais, seguem suas próprias regras (termos de uso) e podem exigir até carta rogatória para cumprir uma decisão judicial brasileira se os servidores estiverem no exterior.
Avaliando Ativos Digitais Específicos: Um Olhar Técnico
Determinar o valor de um bem digital para o inventário nem sempre é simples. Diferente de um imóvel ou carro, muitos ativos digitais exigem conhecimento técnico especializado para serem avaliados.
Veja alguns exemplos práticos de como essa avaliação funciona, frequentemente exigindo um perito (um especialista):
- Canais Monetizados (YouTube, Twitch): A avaliação considera a receita histórica (últimos 12-24 meses), métricas de engajamento (inscritos, visualizações), contratos de publicidade e o potencial de receita futura. Pode-se usar múltiplos da receita média ou fluxo de caixa projetado. Um perito em marketing digital pode ser necessário.
- Domínios de Internet de Alto Valor: O valor depende do tráfego que ele atrai, palavras-chave, potencial comercial, idade, histórico de vendas de domínios parecidos. Ferramentas online e a análise de um especialista em domínios ou marketing digital ajudam.
- NFTs (Tokens Não Fungíveis): A avaliação se baseia na cotação em marketplaces especializados (como OpenSea) na data do óbito ou avaliação, a raridade do token e a demanda no mercado. Um perito em criptoativos ou arte digital é comum.
- Criptomoedas: O valor é calculado pela cotação em exchanges na data do óbito. Se estiverem em carteiras privadas, o desafio é acessá-las.
O perito judicial é fundamental em casos complexos. Ele pode auxiliar no acesso técnico a dados protegidos (dentro dos limites da ordem judicial) e, principalmente, elaborar um laudo técnico fundamentado para determinar o valor desses ativos digitais. O PL 4/2025, inclusive, propõe a figura do “inventariante digital”, que seria um auxiliar técnico para lidar com o acervo digital.
Passo a Passo: Como Obter Acesso Judicial a Bens Digitais no Inventário
A ausência de legislação específica sobre “herança digital” no Brasil torna o acesso aos bens digitais de uma pessoa falecida um processo que frequentemente exige intervenção judicial. Juízes têm recorrido às normas gerais do direito das sucessões e da personalidade para lidar com esses casos. Para o inventariante, navegar por este processo pode ser complexo, mas seguir etapas estruturadas aumenta as chances de sucesso.
Aqui está um guia detalhado dos passos geralmente envolvidos na busca por acesso judicial a bens digitais durante um inventário:
Passo 1: Abertura do Inventário e Identificação Preliminar dos Bens Digitais
- O processo começa com a abertura do inventário, seja ele judicial ou extrajudicial. O inventariante tem o dever geral de conservar e administrar todos os bens do espólio, o que hoje inclui os bens digitais.
- O inventariante deve diligenciar para identificar a existência de ativos virtuais, como contas de e-mail, perfis em redes sociais, serviços de nuvem, carteiras de criptomoedas, domínios de internet, canais monetizados, milhas aéreas e outros. Na petição inicial do inventário (judicial ou extrajudicial), é recomendado arrolar todos os bens digitais conhecidos.
- Desafio Inicial: A identificação desses bens pode ser difícil sem acesso às credenciais do falecido. A investigação preliminar exaustiva, incluindo a busca por e-mails antigos, faturas, conversas com familiares e quaisquer indícios das contas e senhas, é crucial.
Passo 2: Escolha da Via Processual: Incidente no Inventário ou Ação Autônoma
- Geralmente, o pedido de acesso judicial deve ser formulado de forma incidental nos próprios autos do processo de inventário. Esta via centraliza a discussão sobre a composição do espólio perante o juiz já responsável pelo caso, otimizando o processo.
- No entanto, uma ação autônoma (separada do inventário principal), como uma ação de obrigação de fazer ou de exibição de documentos, pode ser necessária ou mais adequada em circunstâncias específicas:
- Quando a obtenção do acesso ou a avaliação envolver alta complexidade técnica ou probatória (ex: quebra de criptografia, recuperação de dados danificados, investigações em múltiplas plataformas, especialmente no exterior).
- Quando há questões de alta indagação que exigem análise aprofundada e não devem “tumultuar” o inventário (ex: controvérsia sobre a titularidade do bem digital, análise complexa de contratos de adesão, litígio sobre a natureza do bem).
- Quando há resistência expressa e significativa da plataforma digital em cooperar.
Passo 3: Preparação da Petição Inicial ou Incidental
- A petição que solicita o acesso judicial deve ser robusta e bem fundamentada. O inventariante deve apresentar ao juízo:
- A comprovação de sua legitimidade para representar o espólio, juntando o termo de inventariante ou a decisão judicial de nomeação.
- Uma listagem detalhada dos bens digitais a serem acessados, incluindo URLs, nomes de usuário, identificadores de contas/carteiras, etc..
- Provas de titularidade ou indícios fortes de que os ativos digitais pertenciam ao falecido (ex: e-mails de registro, contratos, prints de tela que vinculem a conta ao de cujus). Esta é uma prova crucial para vincular o bem ao espólio.
- Uma justificativa detalhada da necessidade do acesso. A natureza do bem digital (patrimonial ou existencial) influencia a justificativa exigida.
- Para Bens Digitais Patrimoniais (criptomoedas, contas monetizadas, domínios): Demonstrar a relevância econômica do bem e a necessidade do acesso para fins de inventário, partilha entre herdeiros e cálculo de ITCMD. Juntar indícios concretos de valor (extratos, relatórios de monetização, cotações).
- Para Bens Digitais Existenciais/Pessoais (e-mails, fotos, mensagens privadas): É necessária uma “justa causa” clara e convincente. Esta pode incluir a necessidade de obter documentos ou informações essenciais para o inventário (apólices, contratos, dívidas), a busca por elementos que possam elucidar circunstâncias da morte (mais delicado), ou a preservação da memória familiar (valor afetivo único). O acesso a conteúdos estritamente pessoais requer cautela e autorização judicial.
- Informar ao juízo sobre a ausência de disposição expressa em contrário do falecido (como testamento digital ou diretivas). A ausência de manifestação contrária pode tornar os tribunais mais flexíveis, mas não garante acesso indiscriminado.
- Comprovar as tentativas prévias de acesso pela via administrativa junto à plataforma e a recusa ou falta de cooperação. Isto demonstra a necessidade da intervenção judicial.
- Anexar, se possível, cópias dos Termos de Serviço da plataforma, evidenciando as políticas restritivas.
Passo 4: Juntada da Documentação Essencial
- Além dos documentos já mencionados na petição inicial, o inventariante deve juntar as seguintes provas:
- Documentos básicos do inventário: Certidão de óbito, documentos de habilitação dos herdeiros e do inventariante, Termo de Inventariante.
- Provas da existência e titularidade dos bens digitais: Extratos de contas digitais (bancárias, exchanges de criptoativos), registros de compra de domínios, relatórios de monetização (YouTube, etc.), prints de tela das contas, e-mails de registro, URLs/IDs de usuário. Para plataformas estrangeiras, comprovantes de titularidade são essenciais.
- Indícios de valor econômico: Cotações de criptoativos na data do óbito, avaliações preliminares, histórico de transações.
- Provas das tentativas administrativas e recusa da plataforma (e-mails, protocolos de atendimento, respostas).
Passo 5: Escolha e Manejo do Instrumento Judicial Adequado
- A escolha do instrumento judicial depende da natureza do bem e da complexidade do acesso. Os mais comuns são:
- Alvará Judicial Específico: Adequado quando o direito do espólio sobre o bem digital é claro, de valor líquido e certo, e não há expectativa de grande resistência da plataforma (ex: liberação de saldos bancários ou valores em criptomoedas já identificados em exchanges nacionais colaborativas).
- Ação de Exibição de Documento ou Coisa: Mais robusto para obter dados, informações ou o conteúdo digital armazenado (e-mails, mensagens, arquivos na nuvem) de provedores que não cooperam. Permite o uso de medidas coercitivas (multas diárias) em caso de descumprimento.
- Tutela de Urgência (Cautelar ou Antecipada): Pode ser solicitada incidentalmente ou em ação autônoma para garantir acesso rápido aos bens digitais quando há risco de perda, dissipação ou deterioração (ex: conta de criptomoedas voláteis, risco de exclusão de conta por inatividade). Exige a demonstração de probabilidade do direito (fumus boni iuris) e perigo de dano (periculum in mora).
- O juiz pode emitir um Ofício Judicial direcionado à plataforma determinando o fornecimento de acesso.
- Para plataformas sediadas no exterior, pode ser necessária uma Carta Rogatória ou cooperação internacional.
Passo 6: Decisão Judicial e Critérios Adotados
- Ao analisar o pedido de acesso, o juiz ponderará os direitos e interesses em jogo: o direito à herança e à informação dos herdeiros versus o direito à privacidade, à intimidade e ao sigilo das comunicações do falecido e de terceiros.
- Os principais critérios que influenciam a decisão judicial incluem:
- Relevância Econômica Comprovada: Principal critério para bens patrimoniais.
- Justa Causa: Essencial para acesso a conteúdos existenciais.
- Ausência de Manifestação Expressa em Contrário do Falecido: A falta de diretivas do de cujus pode ser um fator favorável.
- Necessidade para a Administração do Espólio: O acesso deve ser indispensável para que o inventariante cumpra seus deveres legais.
- A jurisprudência ainda demonstra divergências, com alguns tribunais como o TJSP mostrando maior flexibilidade em casos com valor afetivo/econômico e ausência de oposição, enquanto outros, como o TJMG, tendem a ser mais restritivos, priorizando a proteção da privacidade e exigindo relevância econômica ou justa causa robusta.
Passo 7: Lidar com Desafios Pós-Decisão
- Mesmo após obter uma decisão favorável, o inventariante pode enfrentar desafios, especialmente com plataformas digitais estrangeiras. Muitas multinacionais podem resistir ao cumprimento da ordem judicial, alegando sigilo ou exigindo procedimentos complexos como carta rogatória.
- Barreiras linguísticas e legais podem exigir a tradução juramentada de documentos eletrônicos.
- O inventariante pode precisar insistir junto ao Poder Judiciário, via Ministério Público ou cooperação internacional, para obrigar ou persuadir a plataforma a cumprir a ordem.
Passo 8: A Importância da Perícia Técnica
- Em muitos casos, o acesso aos bens digitais ou sua avaliação exigirá conhecimento técnico especializado. O juiz pode determinar a realização de perícia técnica:
- Quando há dificuldade de acesso técnico (quebra de senhas/criptografia autorizada, recuperação de dados danificados).
- Para verificar a autenticidade de documentos ou ativos digitais.
- Para realizar a avaliação de ativos digitais complexos (NFTs, softwares proprietários, bases de dados, contas monetizadas de alto valor).
- Em caso de disputa fundamentada entre herdeiros sobre o valor de um bem digital.
- O perito judicial (expert em informática forense ou ativos digitais) atuará como auxiliar do juízo, auxiliando no acesso (com autorização judicial), recuperação, autenticação e avaliação imparcial dos bens.
- O PL 4/2025 propõe a figura do “inventariante digital”, um perito técnico especializado nomeado para auxiliar na identificação, classificação e avaliação do acervo digital.
Passo 9: Proteção de Dados e Sigilo no Processo Judicial
- Mesmo com autorização judicial, o inventariante tem o dever de guardar sigilo e confidencialidade sobre dados pessoais do falecido.
- Embora a LGPD possa não se aplicar diretamente a dados de falecidos, os direitos da personalidade (intimidade, imagem) persistem, e os princípios da lei orientam a cautela.
- O sigilo constitucional das comunicações (e-mails, mensagens) é protegido e sua quebra exige ordem judicial específica e fundamentada.
- O acesso não é irrestrito, especialmente a dados sensíveis ou dados de terceiros que interagiram com o falecido. O juiz pode impor restrições, como limitar o escopo da busca, determinar acesso supervisionado por perito ou vedar a divulgação de conteúdo de terceiros.
- O PL 4/2025 reforça a tutela da privacidade pós-morte, delimitando que o acesso a mensagens privadas só é permitido com autorização judicial e comprovação de “necessidade”.
Passo 10: Avaliação dos Bens Digitais (Após o Acesso)
- Uma vez obtido o acesso, os bens digitais com valor econômico devem ser avaliados para fins de partilha e cálculo do ITCMD.
- A avaliação pode ser feita com base em critérios de mercado (cotações para criptomoedas, valor de transações similares para domínios) ou por meio de perícia técnica, especialmente para ativos mais complexos (softwares, bases de dados, itens de jogos). O perito pode apurar o saldo em criptomoedas na data do óbito, converter para moeda corrente.
- A avaliação é formalizada em laudo técnico ou relatório a ser juntado ao inventário.

O Impacto do PL 4/2025: Um Futuro Mais Claro?
A falta de clareza legal gera insegurança. Por isso, projetos de lei buscam modernizar o direito, e o Projeto de Lei nº 4/2025 (que revisa o Código Civil) se destaca.
O que esperar, se ele for aprovado?
- Definição de Patrimônio Digital: O PL traz um conceito legal para “patrimônio digital”, abrangendo ativos com valor econômico, pessoal ou cultural.
- Regras Claras para Mensagens Privadas: A proposta proíbe o acesso indiscriminado a mensagens privadas do falecido. O acesso só seria permitido se o falecido deixou instruções expressas (testamento digital, por exemplo) ou se o herdeiro comprovar em juízo uma necessidade justificada (interesse pessoal ou econômico relevante).
- Força da Escritura Pública (Extrajudicial): O PL pode estabelecer que a escritura pública de inventário extrajudicial seja um título válido para transferir bens digitais, e exigir que plataformas reconheçam o processo extrajudicial. No entanto, o poder coercitivo para obrigar plataformas internacionais ainda seria limitado.
- Inventariante Digital: Introduz essa figura especializada para auxiliar o juiz com os desafios técnicos e de avaliação do acervo digital.
- Potencial Nulidade de Termos Restritivos: Há uma expectativa de que o PL ou leis complementares possam considerar nulas cláusulas de termos de serviço que impeçam ou dificultem a transmissão de bens digitais de valor econômico aos herdeiros.
Em resumo, o PL 4/2025 tenta “codificar” o que a jurisprudência já vem construindo, trazendo mais segurança jurídica. Contudo, a tensão entre herança e privacidade, especialmente sobre o conteúdo de mensagens, ainda exigirá ponderação judicial.
Inventário Extrajudicial de Bens Digitais: Desafios, Avaliação e Exemplos
O inventário extrajudicial, regido pela Lei nº 11.441/2007, constitui uma alternativa mais ágil e potencialmente menos onerosa para a partilha de bens após o falecimento do titular. Contudo, sua aplicação à herança digital apresenta desafios e limitações específicos.
Competência Legal do Tabelião de Notas
O Tabelião de Notas possui competência para lavrar escrituras públicas de inventário e partilha que incluam bens com valor econômico, o que, por extensão, abrange bens digitais patrimoniais. No entanto, essa competência é limitada em comparação à do Poder Judiciário. A principal limitação reside na ausência de poder coercitivo do tabelião para exigir informações ou acesso de plataformas digitais. A atuação do cartório depende essencialmente da cooperação voluntária dos herdeiros e das empresas detentoras dos serviços digitais.
Bens Digitais Passíveis de Inclusão Extrajudicial
Devido à limitação do poder coercitivo, os bens digitais que são realisticamente passíveis de inclusão em inventário extrajudicial são aqueles cuja existência e titularidade podem ser comprovadas por documentação adequada e onde há alguma colaboração da plataforma:
- Criptomoedas em Exchanges Nacionais Colaborativas: Se a exchange brasileira cooperar e fornecer extratos/comprovantes de saldo mediante a escritura de inventário.
- Domínios de Internet Registrados em Nome do Falecido: Domínios são ativos intangíveis registráveis. Se o órgão de registro permitir a transferência mediante documentação sucessória extrajudicial.
- Contas com Saldo Claro e Comprovável: Contas em plataformas que funcionam como instituições financeiras e fornecem extratos claros (ex: PayPal, contas de pagamento), desde que a plataforma colabore. Contas de monetização com receitas documentadas também podem ser incluídas.
- Milhas Aéreas e Programas de Fidelidade: Alguns programas permitem a transferência a herdeiros conforme seus termos e condições.
- Direitos Autorais sobre Obras Digitais: Se economicamente mensuráveis e transferíveis (softwares, músicas, livros digitais).
Bens como NFTs sem mercado secundário estabelecido, ativos em jogos online sem valor de mercado claro, contas em plataformas internacionais não cooperativas ou criptomoedas em carteiras privadas sem chaves de acesso são de inclusão complexa na via extrajudicial. Bens estritamente pessoais sem valor patrimonial (fotos, e-mails pessoais) também têm tratamento incerto, pois a via extrajudicial foca na partilha de patrimônio.

Requisitos Práticos e Documentação Específica em Cartório
Para incluir bens digitais em inventário extrajudicial, além da documentação padrão (certidão de óbito, documentos dos herdeiros e inventariante, certidões negativas, etc.), o tabelião geralmente solicitará:
- Relatórios de extrato das contas digitais.
- Comprovantes de titularidade: Contratos com plataformas, e-mails de confirmação, certificados de registro (domínios), prints de tela autenticados (com ressalvas), relatórios de monetização.
- Declarações das plataformas sobre saldos (quando disponíveis).
- Provas de Valor / Avaliações: Laudos de avaliação para ativos de valor não facilmente verificável, cotações (criptomoedas), relatórios de rendimentos (canais monetizados). Em alguns casos, pode-se usar estimativa ou declaração dos herdeiros, dependendo do tabelião e do bem.
- Declaração detalhada dos herdeiros sobre a natureza, localização e forma de acesso dos bens digitais.
A escritura pública de inventário e partilha deve descrever os bens digitais de forma completa para individualizá-los.
Principais Desafios e Limitações da Via Extrajudicial
As maiores barreiras para o inventário extrajudicial de bens digitais incluem:
- Resistência ou falta de cooperação das plataformas digitais, especialmente estrangeiras, que frequentemente negam acesso ou informações sem ordem judicial.
- A necessidade de senhas para acessar muitos ativos digitais, as quais o tabelião não tem poder de obter compulsoriamente.
- A avaliação complexa de certos ativos digitais, que pode ser difícil de realizar de forma simplificada na via extrajudicial.
- A ausência de legislação específica sobre herança digital e a falta de normativas uniformes para os cartórios, gerando insegurança jurídica e dependência da interpretação individual de cada tabelião. Não existem orientações específicas consolidadas das Corregedorias de Justiça ou do Colégio Notarial do Brasil.
Exemplos Específicos de Avaliação e Inclusão
A inclusão e avaliação de bens digitais patrimoniais no inventário (judicial ou extrajudicial, se viável) exige análise caso a caso, muitas vezes com auxílio técnico. Os métodos de avaliação descritos nas fontes são aplicáveis em ambos os contextos, sendo que no extrajudicial pode ser necessário apresentar um laudo de avaliação aceito pelo tabelião:
- Canais Monetizados (YouTube, Twitch, etc.):
- Forma de Inclusão na Petição/Escritura: Descrever os direitos econômicos sobre o canal, nome, plataforma, URL, receita média e valor avaliado.
- Prova de Titularidade/Existência: E-mail de criação, acesso ao painel de controle, extratos de pagamento, prints autenticados.
- Método de Avaliação: Análise da média de receita dos últimos meses, fluxo de caixa descontado (para receita estável), múltiplos de receita ou comparação com canais semelhantes. Pode ser necessário perito em avaliação de negócios digitais. O ITCMD incidirá sobre o valor patrimonial apurado.
- Formalização: Declaração do inventariante com base em relatórios ou laudo de perito.
- Domínios de Internet de Alto Valor:
- Forma de Inclusão na Petição/Escritura: Listar o domínio, provedor, data de expiração, anexar comprovantes.
- Prova de Titularidade: Certificado de registro, histórico de whois, contratos de hospedagem/registro, e-mails de confirmação.
- Método de Avaliação: Valor de transações recentes de domínios similares, receita gerada, potencial de marca/tráfego. Pode-se usar ferramentas de avaliação, consultas a especialistas ou leilão especializado.
- Formalização: Relatório de corretor de domínios ou perito em tecnologia. Laudo pericial. Declaração fundamentada do inventariante.
- NFTs (Tokens Não Fungíveis):
- Forma de Inclusão na Petição/Escritura: Descrever o NFT (nome, ID, coleção), endereço da carteira, blockchain e valor avaliado.
- Prova de Titularidade/Existência: Capturas de tela da carteira, registros em blockchain, e-mails de compra.
- Método de Avaliação: Cotação em marketplace na data da sucessão ou avaliação, análise de vendas recentes de NFTs similares, raridade, demanda. Pode ser necessário perito especializado em criptoativos.
- Formalização: Extratos de marketplaces, laudo de especialista.
- Contas em Jogos Online com Itens Valiosos:
- Forma de Inclusão na Petição/Escritura: Descrever a conta (jogo, username), listar itens valiosos e/ou saldo de moeda virtual, valor avaliado.
- Prova de Titularidade/Existência: Acesso à conta, e-mails de registro, prints do inventário de itens, histórico de compras.
- Método de Avaliação: Valor de mercado dos itens em marketplaces secundários (muitas vezes não oficiais), custo de aquisição, avaliação por especialista em economia virtual ou jogadores experientes. Análise de vendas de contas similares, raridade, demanda. Pode ser necessário perito especializado em jogos digitais.
- Formalização: Relatório do inventariante com base em pesquisa. Laudo de perito em casos de alto valor.
- Grandes Bases de Dados ou Softwares Proprietários:
- Forma de Inclusão na Petição/Escritura: Descrever os direitos de propriedade intelectual sobre o software (nome, versão, código-fonte, documentação, direitos de exploração) ou a base de dados (tipo de dados, potencial comercial).
- Prova de Titularidade: Registro no INPI (se houver), contratos de desenvolvimento/licenças comerciais, documentação técnica, arquivos, e-mails comprovando criação/aquisição.
- Método de Avaliação: Fluxo de caixa descontado da exploração comercial, custo de desenvolvimento reconstituído, avaliação comparativa de softwares/bases de dados similares. Múltiplo de receita (para software com receita recorrente), valor de mercado (ofertas recebidas). Perito em propriedade intelectual, engenheiros de software, analistas de dados podem ser necessários.
- Formalização: Laudo de avaliação econômica assinado por perito.
Em suma, embora o inventário extrajudicial seja uma via mais célere para a partilha de bens tradicionais, sua aplicação à herança digital é limitada pela ausência de poder coercitivo do tabelião e pela falta de cooperação das plataformas. Contudo, para ativos digitais patrimoniais com documentação clara e onde há colaboração de terceiros, a inclusão e avaliação na escritura pública de inventário é possível, exigindo do inventariante a apresentação de provas robustas de existência, titularidade e valor.
A História de Maria e a saga para Acessar a Herança Digital de João
A vida de Maria virou de ponta-cabeça quando seu pai, João, faleceu inesperadamente. Além da dor da perda, surgiu a complexa tarefa de lidar com o inventário. João, como muitas pessoas hoje em dia, vivia grande parte de sua vida online. Ele não deixou um testamento digital, nem planilhas de senhas. Deixou, sim, muitas lembranças… e bens digitais.
Maria sabia que João tinha investido em criptomoedas. Também sabia que ele guardava anos de fotos de família e documentos importantes em um serviço de nuvem. Havia ainda um blog que ele mantinha, que, embora não fosse sua principal fonte de renda, gerava um pequeno valor e continha conteúdo valioso.
Ao iniciar o inventário tradicional, Maria, nomeada inventariante, incluiu os bens físicos conhecidos. Mas e os digitais? Ela tentou o caminho mais direto: contatar as plataformas. A empresa da nuvem (vamos chamá-la de “Nuvem Y”) e a exchange de criptomoedas (“Exchange X”) foram polidas, mas firmes: por questões de privacidade e segurança, sem uma ordem judicial específica ou um “contato de legado” pré-definido por João, elas não poderiam simplesmente dar a ela as senhas ou transferir os bens. O tabelião do inventário extrajudicial, por sua vez, explicou que, embora pudesse registrar o que ela declarasse, ele não tinha o poder de “forçar” as plataformas a entregar nada.
Foi aí que Maria procurou a Dra. Sofia, uma advogada experiente. Dra. Sofia explicou que, sem a colaboração voluntária das empresas, a via judicial seria o caminho necessário. “É o juiz, e não o tabelião, que tem o poder coercitivo para emitir ordens que as plataformas, em tese, terão que cumprir”, esclareceu.
O primeiro passo no processo judicial foi informar a Juíza Helena, responsável pelo inventário, sobre a existência desses bens digitais desconhecidos ou inacessíveis. Maria, orientada por Dra. Sofia, precisou requerer judicialmente que a juíza ordenasse as diligências para obter acesso a esses bens.
Para convencer a juíza, era crucial justificar por que o acesso era necessário. Para as criptomoedas na “Exchange X”, a justificativa era clara: tratava-se de um bem digital patrimonial, com valor econômico mensurável, que precisava ser arrolado, avaliado e partilhado entre os herdeiros, além de ser base para o cálculo do imposto (ITCMD). Já para as fotos na “Nuvem Y”, a situação era mais delicada. Eram bens digitais existenciais/pessoais, ligados à privacidade de João. Dra. Sofia explicou que para esse tipo de conteúdo, os tribunais exigem uma “justa causa” ou um “interesse legítimo qualificado”. No caso de Maria, a “justa causa” era o valor afetivo inestimável das memórias de família, e o fato de Maria ser a única herdeira, sem que João tivesse deixado qualquer disposição contrária ao acesso pela família.
A documentação foi fundamental. Maria juntou a certidão de óbito, o termo que a nomeou inventariante, e todas as provas que conseguiu da existência dos bens digitais: um extrato antigo de uma conta bancária mostrando uma transferência para a “Exchange X”, um e-mail de confirmação de cadastro na “Nuvem Y”, e até prints de tela do blog de João na “Plataforma Z”. Eles também anexaram as respostas negativas das plataformas às tentativas de acesso administrativo.
Com a petição bem fundamentada, a Juíza Helena analisou o pedido. Para as criptomoedas, reconhecendo o valor patrimonial, ela concedeu um alvará específico, ordenando à “Exchange X” que fornecesse as informações ou o acesso necessário a Maria. Para as fotos, a juíza agiu com mais cautela, ponderando o direito de Maria às memórias contra a privacidade de João e de terceiros que pudessem aparecer nas fotos. Ela poderia, por exemplo, autorizar o acesso apenas a um perito técnico que filtrasse o conteúdo relevante para o inventário ou a família, excluindo comunicações privadas.
Mesmo com a ordem judicial em mãos, Maria e Dra. Sofia enfrentaram desafios práticos. A “Exchange X” era uma empresa estrangeira, e cumprir a ordem judicial brasileira exigiu procedimentos de cooperação jurídica internacional, tornando o processo mais longo e custoso. A “Nuvem Y” também apresentou dificuldades técnicas para a recuperação dos arquivos.
Apesar dos obstáculos, a persistência de Maria e a atuação estratégica de Dra. Sofia, utilizando os mecanismos judiciais disponíveis, permitiram que parte significativa da herança digital de João fosse identificada, acessada, avaliada (contando com a ajuda de um especialista para precificar o blog e as criptos) e, ao final, incluída na partilha do inventário. A história de Maria ilustra que, embora complexo e desafiador, o caminho judicial é, muitas vezes, o único para garantir que o patrimônio e, em alguns casos, as memórias digitais de quem se foi, possam ser acessados e transmitidos aos seus herdeiros.
Casos da Vida Real (e Seus Desafios): Estudos Práticos na Herança Digital
Entender a teoria é importante, mas nada ilustra melhor os desafios da herança digital do que exemplos práticos. Vejamos alguns cenários baseados em decisões judiciais e na experiência comum, para entender como o judiciário e os inventariantes têm lidado com essa nova realidade:
Cenário 1: As Memórias Digitais de um Jovem – O “Caso Apple ID” no TJSP
- A Situação: Após a perda trágica de uma filha jovem, os pais, únicos herdeiros, buscavam acesso ao conteúdo do ID Apple dela (fotos, vídeos, etc.). Para eles, era uma forma preciosa de manter viva a memória afetiva da filha. Não havia testamento, nem qualquer indicação da filha sobre o que fazer com seus dados digitais. A Apple, seguindo suas políticas, exigia uma ordem judicial.
- A Estratégia Judicial: Os pais, via inventariante, entraram com um pedido judicial para obter o acesso. O argumento principal se baseou no valor afetivo do conteúdo digital e no fato de serem os únicos herdeiros, sem que a falecida tivesse deixado qualquer disposição em contrário. Buscaram a via judicial, pois o tabelião no inventário extrajudicial não teria poder para ordenar à plataforma.
- O Resultado e o Raciocínio do Tribunal: O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) concedeu o acesso. A decisão reconheceu que o “patrimônio digital” pode ter conteúdo afetivo e econômico e deve integrar o espólio. Considerou-se que não havia disposição em contrário pela falecida, nem resistência qualificada do provedor à ordem judicial. O tribunal ponderou o direito dos herdeiros às memórias contra a privacidade da falecida, concluindo que, naquele caso específico (conteúdo familiar, únicos herdeiros, ausência de veto expresso), o acesso era justificado.
- Lição Aprendida (Prós e Contras da Estratégia):
- Pró: A via judicial, com uma fundamentação sólida baseada no valor afetivo e na ausência de vontade contrária do falecido, pode ser bem-sucedida mesmo para bens digitais de natureza primordialmente pessoal/existencial. Mostra que a interpretação judicial busca adaptar os princípios sucessórios à nova realidade.
- Contra: O sucesso depende da sensibilidade do juiz, da força da argumentação sobre a “justa causa” ou “interesse legítimo”, e da postura da plataforma diante da ordem judicial. Não há garantia de acesso.
Cenário 2: O E-mail Essencial para o Inventário no TJSP
- A Situação: Uma viúva, inventariante, precisava urgentemente acessar a conta de e-mail de seu falecido marido. Ela suspeitava que o e-mail continha informações cruciais para o inventário, como a localização de documentos, comprovantes de dívidas ou, especialmente, a única cópia de uma apólice de seguro de vida.
- A Estratégia Judicial: A viúva solicitou judicialmente o acesso ao e-mail, justificando a necessidade pela “administração do espólio” e pela busca de documentos essenciais para o inventário. Este pedido foi feito no contexto do inventário judicial.
- O Resultado e o Raciocínio do Tribunal: O TJSP autorizou o acesso. O tribunal considerou que a necessidade de obter documentos relevantes para o inventário configurava uma clara e evidente “justa causa” que justificava a ponderação e a autorização de acesso ao conteúdo, mesmo sendo uma comunicação privada.
- Lição Aprendida (Prós e Contras da Estratégia):
- Pró: Quando o acesso a um bem digital, mesmo que pessoal (como um e-mail), é objetivamente necessário para o processamento do inventário (localizar bens, dívidas, credores, documentos), a probabilidade de sucesso judicial aumenta significativamente. O juiz tende a priorizar a função do inventário de liquidar e partilhar o patrimônio.
- Contra: O acesso foi justificado pela necessidade patrimonial/administrativa. Um pedido para acessar o mesmo e-mail apenas por curiosidade ou para ler comunicações privadas sem essa “justa causa” forte provavelmente seria negado. O acesso a dados de terceiros contidos no e-mail ainda requer cautela e pode ser limitado pelo juiz.
Cenário 3: O Celular Bloqueado e a Privacidade no TJMG
- A Situação: Em outro caso, pais de uma filha falecida buscavam acesso ao conteúdo do celular dela. Alegavam, inclusive, que serviços técnicos licenciados não conseguiam desbloquear o aparelho devido às normas de segurança do fabricante.
- A Estratégia Judicial: Os pais pediram acesso judicial ao conteúdo do dispositivo.
- O Resultado e o Raciocínio do Tribunal: O TJMG, em primeira instância (e, em alguns casos, mantido em grau recursal), negou o pedido. A justificativa baseou-se fortemente na proteção do sigilo das comunicações (previsto na Constituição Federal) e nos direitos da personalidade da própria falecida e de terceiros que poderiam ter trocado informações privadas com ela. O tribunal ponderou que a ausência de uma justificativa imperiosa relacionada à administração do espólio ou a uma “justa causa” clara não superava a proteção constitucional à privacidade.
- Lição Aprendida (Prós e Contras da Estratégia):
- Pró: N/A. Este caso ilustra uma estratégia que não funcionou, destacando as barreiras.
- Contra: O acesso a dispositivos com conteúdo primariamente pessoal e comunicações privadas é altamente restrito. A proteção à privacidade e ao sigilo, incluindo a de terceiros, é um forte obstáculo judicial. A mera alegação de que o dispositivo contém “tudo da vida” da pessoa ou o valor sentimental do conteúdo pode não ser suficiente para superar a proteção constitucional.
Cenário 4: Criptomoedas, Canais Monetizados e Domínios – O Foco no Patrimônio
- A Situação: João (voltando ao nosso personagem fictício), além de bens físicos, possuía investimentos em criptomoedas em uma exchange nacional, um domínio de internet com potencial comercial e um canal monetizado em uma plataforma de vídeos. Maria, a inventariante, sabia da existência desses bens, mas não tinha as senhas ou informações de acesso detalhadas.
- A Estratégia Judicial: Maria, orientada por sua advogada, incluiu esses bens nas primeiras declarações do inventário judicial. Para as criptomoedas na exchange nacional e o domínio com registro comprovado, juntou provas que indicavam a titularidade (extratos bancários mostrando transações para a exchange, e-mails de registro do domínio). Para o canal monetizado, buscou evidências de monetização e relatórios de receita (se disponíveis). Requereram ao juiz que ordenasse às plataformas (exchange, provedor de domínio, plataforma de vídeos) que fornecessem os extratos completos, dados de acesso ou transferissem a titularidade dos bens patrimoniais. Para a avaliação, pediram a nomeação de um perito, especialmente para o canal e o domínio, pois o valor não era facilmente mensurável.
- O Resultado e o Raciocínio Típico dos Tribunais: Para bens digitais com valor econômico claro e mensurável, a tendência judicial é favorecer o acesso e a inclusão no inventário. O juiz geralmente expedirá alvarás ou ofícios específicos às plataformas para obter as informações ou o acesso necessário para arrolar, avaliar e partilhar esses bens. A avaliação, se complexa, será feita por perito.
- Lição Aprendida (Prós e Contras da Estratégia):
- Pró: O caminho judicial é essencial para obter acesso a bens digitais patrimoniais quando o acesso direto não é possível. A natureza patrimonial do bem facilita a obtenção da ordem judicial, pois está diretamente ligada ao direito fundamental à herança. O uso da perícia é a estratégia para superar desafios de acesso e avaliação complexos.
- Contra: Mesmo com ordem judicial, pode haver resistência das plataformas, especialmente se forem estrangeiras. Obter cumprimento pode exigir cooperação jurídica internacional (carta rogatória) e enfrentar barreiras técnicas e legais no exterior. A avaliação de certos ativos (como canais monetizados ou NFTs) ainda carece de metodologia padronizada e pode ser subjetiva.
Estes exemplos mostram que cada caso de herança digital é único e exige uma análise cuidadosa da natureza do bem (patrimonial vs. existencial), da justificativa para o acesso e das barreiras práticas a serem superadas. O caminho judicial, embora muitas vezes necessário, não é isento de desafios, especialmente ao lidar com a privacidade do falecido e a resistência de grandes plataformas digitais. A documentação e a assessoria jurídica especializada são fundamentais. Esse conteúdo é ilustrativo e não substitui a consulta a um advogado especializado em direito sucessório e digital para o seu caso específico.
FAQ: Perguntas Frequentes sobre Acesso a Bens Digitais no Inventário
Aqui você encontra respostas para as dúvidas mais comuns sobre como lidar com a herança digital no processo de inventário no Brasil, especialmente quando é preciso recorrer à via judicial.
- O que é “Herança Digital”?
Herança Digital é o conjunto de bens, direitos e obrigações de natureza digital deixados por uma pessoa falecida (de cujus). Isso inclui um vasto espectro de ativos, desde aqueles com claro valor econômico (criptomoedas, saldos em contas digitais, milhas, canais monetizados, domínios de internet) até conteúdos de valor predominantemente sentimental, pessoal ou existencial (e-mails, fotos, vídeos pessoais, mensagens em redes sociais).
- Por que a via judicial costuma ser necessária para acessar bens digitais no inventário?
Enquanto o inventário extrajudicial (em cartório) é mais rápido, o Tabelião de Notas não possui poder coercitivo. Isso significa que ele não pode forçar plataformas digitais a fornecerem informações, dados de acesso ou transferirem titularidade de bens. Muitas plataformas se recusam a colaborar administrativamente, baseadas em seus termos de serviço e políticas de privacidade. A via judicial se torna indispensável porque o juiz possui mecanismos legais (como alvarás e ordens de exibição) para compelir essas empresas a fornecerem o acesso ou as informações necessárias.
- Qual a diferença entre bens digitais patrimoniais e existenciais no contexto do inventário?
Os tribunais diferenciam esses tipos:
- Bens Digitais Patrimoniais: São aqueles com valor econômico mensurável. Exemplos incluem criptomoedas, contas monetizadas (como canais no YouTube), domínios de internet, contas com saldo monetário verificável (ex: PayPal). Esses são geralmente tratados como bens intangíveis que integram o patrimônio do falecido e devem ser arrolados e avaliados no inventário.
- Bens Digitais Existenciais/Pessoais: Vinculam-se aos direitos da personalidade (intimidade, imagem, privacidade) e, em regra, são considerados intransmissíveis. Incluem fotos e vídeos privados, e-mails pessoais, mensagens privadas e redes sociais não monetizadas. O acesso a esses conteúdos é tratado com maior cautela judicial e geralmente só é permitido mediante comprovação de “justa causa”.
- Como iniciar o passo a passo judicial para obter acesso aos bens digitais?
O procedimento geralmente começa com o inventariante informando ao juízo a existência dos bens digitais conhecidos na petição inicial do inventário ou em uma petição incidental no processo já em trâmite. É preciso requerer que o juízo ordene diligências para obter esses bens ou informações. O pedido deve ser instruído com documentação e uma justificativa clara para a necessidade do acesso.
- Quais documentos são geralmente exigidos para solicitar o acesso judicial aos bens digitais?
É fundamental apresentar:
- Documentos básicos do inventário: Certidão de óbito e termo de nomeação do inventariante.
- Provas da existência e titularidade dos bens digitais: Extratos (bancários para cripto, de monetização), comprovantes de titularidade (e-mails de registro, certificados de domínio), prints de tela da conta, indicação das URLs/IDs.
- Justificativa para o acesso: Demonstrar o valor econômico dos bens patrimoniais ou uma “justa causa” relevante para conteúdos pessoais.
- Comprovação de tentativas administrativas frustradas: Mostrar que se tentou obter o acesso diretamente com a plataforma e houve recusa.
- Posso acessar as mensagens privadas ou fotos pessoais do falecido por via judicial?
O acesso a conteúdos estritamente pessoais, como mensagens privadas e fotos íntimas, é geralmente restrito e tratado com muita cautela pelos tribunais. Predomina o entendimento de que isso depende da demonstração de uma “justa causa” ou um “interesse legítimo qualificado”, que pode ser patrimonial indireto (ex: e-mail com apólice de seguro) ou, em casos excepcionais, afetivo, desde que não haja oposição do falecido e respeite a privacidade de terceiros. O juiz fará uma rigorosa ponderação entre o direito à herança e o direito à privacidade e intimidade póstuma do falecido e de terceiros. O Projeto de Lei 4/2025, se aprovado, reforça essa restrição, permitindo o acesso a mensagens privadas apenas com autorização judicial mediante comprovação de “necessidade” ou se o falecido deixou autorização prévia.
- Como é feita a avaliação dos bens digitais para fins de inventário e partilha?
A avaliação de bens digitais é um dos desafios práticos. O método depende da natureza do ativo:
- Criptomoedas: Cotação em exchanges na data do óbito.
- Domínios de Internet: Valor de mercado comparável, potencial de tráfego/marca, avaliação por especialista.
- Canais Monetizados (YouTube, etc.): Análise de receita histórica, métricas de engajamento, potencial futuro, avaliação por perito em mídias digitais.
- NFTs: Último preço de venda, ofertas ativas, avaliação por especialista em arte digital/criptoativos.
- Contas em Jogos/Itens Virtuais: Valor em mercados secundários (com ressalvas), custo de aquisição, avaliação por especialista em economia virtual.
Em casos complexos ou de alto valor, a contratação de um perito especializado pode ser necessária.
- O que acontece se os bens digitais ou as plataformas estiverem sediadas no exterior?
A situação se torna mais complexa. As plataformas internacionais podem ter regras próprias e não reconhecer diretamente as ordens judiciais brasileiras. Nesses casos, pode ser necessário recorrer a mecanismos de cooperação jurídica internacional, como a expedição de Carta Rogatória dirigida ao país onde a plataforma ou os servidores estão localizados. Isso envolve procedimentos adicionais, como tradução juramentada de documentos, tornando o processo mais lento e custoso.
- Qual o papel e as responsabilidades do Inventariante em relação aos bens digitais no processo judicial?
O inventariante tem o dever legal de identificar, arrolar, conservar e administrar todos os bens do espólio, incluindo os digitais. Suas responsabilidades específicas incluem:
- Diligenciar para identificar ativos virtuais.
- Informar ao juízo a existência dos bens digitais.
- Requerer judicialmente o acesso a contas ou dados bloqueados.
- Promover a avaliação dos bens digitais patrimoniais.
- Guardar sigilo e confidencialidade sobre dados pessoais do falecido e de terceiros, respeitando a LGPD e o sigilo das comunicações.
- Prestar contas de sua administração em relação a esses ativos.
- Como o Projeto de Lei 4/2025, em tramitação, pode impactar a herança digital?
O PL 4/2025 propõe formalizar regras sobre a herança digital no Código Civil. Entre as mudanças esperadas:
- Define “patrimônio digital”.
- Exige o arrolamento obrigatório de bens digitais no inventário (judicial ou extrajudicial).
- Prevê que a escritura pública de inventário/partilha sirva como título hábil para transferência de bens digitais junto às plataformas.
- Estabelece regras mais claras para o acesso a mensagens privadas, limitando-o à autorização judicial com “necessidade” comprovada ou autorização prévia do falecido.
- Apresenta a figura do “inventariante digital”, um profissional especializado para auxiliar na identificação e gestão do acervo digital.
- Pode levar à nulidade de termos de serviço de plataformas que impeçam a transmissão hereditária de bens patrimoniais.
Conclusão
A jornada para lidar com a herança digital no Brasil revela um cenário complexo e em constante evolução. A ausência de uma legislação específica consolidada sobre o tema força magistrados, advogados e inventariantes a recorrerem à aplicação analógica das normas gerais do direito das sucessões, do direito da personalidade e do direito digital, como o Marco Civil da Internet.
O principal desafio reside na distinção crucial que os tribunais vêm fazendo entre os bens digitais:
- Bens Digitais Patrimoniais: Aqueles com valor econômico claro e mensurável (como criptomoedas, contas monetizadas, domínios de internet, saldos em plataformas de pagamento) são geralmente considerados transmissíveis e integráveis ao espólio. Nesses casos, a tendência judicial é favorecer o acesso e a inclusão no inventário, desde que comprovada a titularidade e o valor.
- Bens Digitais Existenciais/Pessoais: Conteúdos ligados à esfera íntima e privada (e-mails pessoais, fotos privadas, mensagens) são vinculados aos direitos da personalidade do falecido e de terceiros, sendo, em regra, considerados intransmissíveis. O acesso a esses bens é altamente restrito e só tem sido autorizado mediante demonstração de uma “justa causa” ou um “interesse legítimo qualificado”, que pode ser patrimonial indireto (como encontrar um documento essencial para o inventário) ou, mais raramente, afetivo relevante, e sempre ponderando a privacidade do falecido e de terceiros.
A via judicial emerge, na maioria das vezes, como o instrumento essencial para o inventariante obter acesso aos bens digitais, especialmente diante da ausência de poder coercitivo dos tabeliães no inventário extrajudicial e da frequente resistência das plataformas digitais em fornecer informações ou acesso sem uma ordem judicial específica. Mesmo com a ordem judicial, a execução contra plataformas estrangeiras apresenta barreiras significativas, exigindo, por vezes, cooperação internacional (carta rogatória).
A identificação, documentação e avaliação de bens digitais patrimoniais específicos (como canais monetizados, domínios de internet, NFTs, contas em jogos) exigem um esforço adicional do inventariante e, frequentemente, a necessidade de conhecimento técnico especializado ou a atuação de peritos para comprovar a existência, titularidade e valor desses ativos no processo de inventário judicial ou extrajudicial.
O Projeto de Lei 4/2025 em trâmite busca trazer maior clareza e formalidade ao tema, prevendo a obrigatoriedade de arrolamento de bens digitais, o reconhecimento da escritura de partilha como título hábil para transferência e, notavelmente, regras mais específicas para o acesso a mensagens privadas, exigindo “necessidade” ou “interesse relevante” via autorização judicial. Se aprovado, o PL 4/2025 poderá simplificar alguns procedimentos e dar maior base legal para a atuação judicial, embora a ponderação entre privacidade e direito à herança, especialmente para conteúdos existenciais, provavelmente continuará a ser um ponto sensível.
Em suma, a herança digital no Brasil ainda caminha para uma maior consolidação jurídica. Aos herdeiros e inventariantes, é fundamental buscar assessoria jurídica especializada, documentar meticulosamente a existência e titularidade dos bens digitais conhecidos, e estar preparado para a via judicial, munido de provas robustas e uma justificativa clara para o acesso pretendido, sempre respeitando os limites impostos pela privacidade do falecido e de terceiros.
O conteúdo não substitui a consulta a um advogado especializado em direito sucessório e digital para o seu caso específico.
Espero que este guia tenha sido útil e esclarecedor. Se você tiver mais dúvidas, não hesite em deixar o seu comentário aqui em baixo. Seu feedback significa o mundo para nós.